segunda-feira, 30 de dezembro de 2019

Gosto do número que se segue, 2020



RECEITA DE ANO NOVO

Para você ganhar belíssimo Ano Novo
cor do arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação com todo o tempo já vivido
(mal vivido talvez ou sem sentido)
para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser;
novo
até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo, espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha,
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,
não precisa expedir nem receber mensagens
(planta recebe mensagens?
passa telegramas?)

Não precisa
fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar arrependido
pelas besteiras consumadas
nem parvamente acreditar
que por decreto de esperança
a partir de janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo direito augusto de viver.

Para ganhar um Ano Novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.
Carlos Drummond de Andrade

sexta-feira, 20 de dezembro de 2019

Boas Festas a quem passa . Natal a vosso jeito...

Natal, e não Dezembro


Entremos, apressados, friorentos,
numa gruta, no bojo de um navio,
num presépio, num prédio, num presídio,
no prédio que amanhã for demolido...
Entremos, inseguros, mas entremos.
Entremos, e depressa, em qualquer sítio,
porque esta noite chama-se Dezembro,
porque sofremos, porque temos frio.

Entremos, dois a dois: somos duzentos,
duzentos mil, doze milhões de nada.
Procuremos o rastro de uma casa,
a cave, a gruta, o sulco de uma nave...
Entremos, despojados, mas entremos.
Das mãos dadas talvez o fogo nasça,
talvez seja Natal e não Dezembro,
talvez universal a consoada.

David Mourão-Ferreira, in 'Cancioneiro de Natal'
Pintura de Cláudia Costa, "O Improvável recreio dos Ícones"

domingo, 15 de dezembro de 2019


LISBOA E A DÍVIDA AO ‘COCÓ’!
Talvez muitos lisboetas desconheçam que devem a Avenida da Liberdade aos ‘cocós’ alfacinhas — que nada têm que ver com excrescências, diga-se! Os ‘cocós’ eram pequenos doces folhados de cor castanha, feitos à base de creme de ovos e amêndoas picadas. Fizeram a fama e a fortuna da Confeitaria Rosa Araújo, aberta em 1840 na rua de São Nicolau pelo casal Silva Araújo. Manuel José e Eulália Rosa aumentaram a família nesse mesmo ano com o nascimento de José Gregório da Rosa Araújo. Consta que o pai sabia cativar a clientela miúda, chamando-os da porta: “Venha cá menino! Venha cá comer um cocó...” O filho começou aos 13 anos a servir na casa, herdando uma fortuna colossal, graças ao prestígio dos ‘pastéis de cocó’.
Eça de Queirós confirma-o em “O Primo Basílio”, onde Alves Coutinho os fixa como uma especialidade: “Para os folhados, o cocó!” A fama do pastel passou a epíteto do filho, o sr. Rosa Araújo, o ‘Cocó’, cidadão muito respeitado que chegou a presidente da Câmara de Lisboa. A sua obra mais emblemática e polémica foi a Avenida da Liberdade. Há 140 anos (agosto de 1879) o bondoso e afável Rosa Araújo, pagou do seu bolso 22.000$00 em expropriações para iniciar a obra que durou até 1886. Troçavam dele chamando-lhe ‘Barão dos Pastéis’ e ‘Haussman-Cocó’, mas foi com a sua herança de décadas a vender ‘cocós’ que se iniciou a cidade moderna, na zona norte da Baixa.
IN, REVISTA EXPRESSO DE 14/12/2019

~Gravura dos Restauradores, 28 de Abril de 1886

terça-feira, 10 de dezembro de 2019

quinta-feira, 5 de dezembro de 2019

Greta Thunber também sabe sorrir... :)

   Espanta-me a forma crítica e arrogante como pessoas criticam uma jovem de 16 anos, super inteligente, fundamentada cientificamente e que incorporou uma preocupação mundial. Deixem para trás o cinismo dos países poluidores . 
   É conhecida mundialmente? Claro, e ainda bem. Tem sponsers ? Ainda bem , para poder viajar a sensibilizar os jovens e os mais velhos....
   Há muita gente acomodada.

Quantas pessoas lutaram por ideais, bem novos, com parcos meios e pouca ou nenhuma liberdade . Eram jovens e diferentes.
Hoje, com os meios à disposição, é impossível as " Gretas" deste mundo passarem por entre gotas de água .
   Venham mais cinco .

Uma post meu , ontem no FB .

Querer, queria...



Quero apenas cinco coisas...
Primeiro é o amor sem fim
A segunda é ver o outono
A terceira é o grave inverno
Em quarto lugar o verão 
A quinta coisa são teus olhos
Não quero dormir sem teus olhos.
Não quero ser... sem que me olhes.
Abro mão da primavera para que continues me olhando.
Pablo Neruda

Pintura de Carl Larsson

sexta-feira, 29 de novembro de 2019

Se...



Se falo, falo-me; se ouço, ouço-me; se pinto, pinto-me ... o único ideal somos nós mesmos.


Gerardo Burmester

Pintura de João Dixo . 1941-2012

sábado, 23 de novembro de 2019

Edgar Morin em Portugal e a sua ternura por pessoas e pelo país


Gostei de ver ontem,  no noticiário da RTP2  a entrevista que Morin deu à jornalista de serviço. Esqueci seu nome... 
 Pode ser vista na RTP play. AQUI

Há algo que vos deixo também por AQUI . 

terça-feira, 19 de novembro de 2019

segunda-feira, 18 de novembro de 2019

domingo, 17 de novembro de 2019

Os homens.... "E agora José ?"


Se todo animal inspira ternura, o que houve, então, com os homens?

Guimarães Rosa

Fotografia do Público /Fugas

sábado, 16 de novembro de 2019

Tempo de marmelos e marmelada .... Tempo de doçura

                                                              Luis Egidio Meléndez, séc. XVIII

terça-feira, 12 de novembro de 2019

Talvez assim tenha nascido o nome do grande romance .... «Sinais de Fogo" , centenário de Jorge de Sena


Acendi um cigarro. Onde iria jantar? Não me apetecia comer. Apetecia-me fugir. Para onde e porquê? E, de repente ouvi dentro da minha cabeça uma frase: «Sinais de fogo as almas se despedem, tranquilas e caladas, destas cinzas frias.» Olhei em volta. De onde viera aquilo? Quem me dissera aquilo? Que sentido tinha aquela frase?Tentei repeti-la para mim mesmo: «Sinais de fogo... » Mas esquecera-me do resto. Com esforço reconstituía a sequência: »Sinais de fogo os homens se despedem, exaustos e espantados, quando a noite da morte desce fria sobre o mar.» Não tinha sido aquilo. Não era aquilo. E que significava? Seriam versos? Repeti mentalmente: «Sinais de cinza os homens se despedem, lançando ao mar os barcos desta vida». Novamente as palavras eram outras, ou quase as mesmas mas diversamente. Tirei um papel do bolso, e escrevi: »Sinais de fogo os homens se despedem lançando ao mar os barcos desta vida». Reli o que escrevera. E depois? Olhei o mar que escurecia , com manchas claras que ondulavam largas. Os barcos iam pelo mar fora, e nalguns havia lanternas acesas. Porquê? »Nas vastas águas...» Nas vastas águas... Era a absurdo. Eu fazendo versos? Porquê? Amarrotei o papel e deitei-o fora.  Mal amarrotado, ele foi descendo num voo balanceante, até que posou numa rocha. Aí, vacilou, aquietou-se, e, numa reviravolta súbita, deixou-se cais para o meio das pedras e sumiu. Era quase noite escura. Voltei para a cidade.



in, Sinais de Fogo, pág. 153/154




Mas quantas personagem /s encontro que ainda fizeram parte da minha adolescência, quanto mais não fosse por interpostos familiares. 

E, como já tenho escrito a Figueira da sua adolescência era diferente da minha infância e puberdade...
32 anos nos separam e tardiamente descobri Jorge de Sena e só em 2012 li Sinais de Fogo.  Hoje raleio com outro olhar e sigo lhe os passos ...  Afinal os caminhos dele também foram os meus em meados do séc. XX . Quase de certeza que a a casa onde passava férias, Rua Fernandes Coelho,  estaria ligada a uma escola primária que frequentei .  A casa está lá ao abandono. 


Em relação ao tio , que tinha sido tropa e era professor num colégio.



Mas o cómico é ele exigir, tu sabias? , que a gente o trate por senhor tenente. Fica uma fera quando alguém o trata por »professor», por «senhor doutor». Responde logo que doutor ele é da mula ruça, mas que ~e mais competente que os lentes de Coimbra. O doutor Carvalho que é lente de Coimbra, esse às vezes diz-lhe, meio sério e meio a brincar, que ele devia tirar o curso de matemática. 




Pág. 148



Ora este DR. Carvalho a que se refere Jorge de Sena, de certeza que é o Professor Doutor Joaquim de Carvalho (aqui), lente na Universidade de Coimbra até Salazar o deixar....


Livro com 662 paginas. Não tenho pressa.


segunda-feira, 11 de novembro de 2019

outono, natureza morta, Josefa d´Óbidos


Canção de Outono

Perdoa-me, folha seca,
não posso cuidar de ti.
Vim para amar neste mundo,
e até do amor me perdi.
De que serviu tecer flores
pelas areias do chão
se havia gente dormindo
sobre o próprio coração?

E não pude levantá-la!
Choro pelo que não fiz.
E pela minha fraqueza
é que sou triste e infeliz.
Perdoa-me, folha seca!
Meus olhos sem força estão
velando e rogando aqueles
que não se levantarão...

Tu és folha de outono
voante pelo jardim.
Deixo-te a minha saudade
- a melhor parte de mim.
E vou por este caminho,
certa de que tudo é vão.
Que tudo é menos que o vento,
menos que as folhas do chão...
Cecília Meireles

sábado, 9 de novembro de 2019

Inquietação ...

"Manet recusa-se a juntar os elementos para contar uma história e é a falta de narrativa, o mistério, que inquietam.”
Michael Fried

sexta-feira, 8 de novembro de 2019

quarta-feira, 6 de novembro de 2019

As Pinturas do Meu Irmao Julio (Manoel de Oliveira, 1965)

Júlio, "pintor da candura"



Júlio dos Reis Pereira. 

Irmão de José Régio. Júlio dos Reis, também poeta, usando pseudónimo de Saul Dias, mas anulado pela poética de seu irmão. Sobressaiu na pintura.
 Foi hoje para mim uma descoberta .


Pintor da candura, artista duma iconografia simbólica por onde as meretrizes irradiam pureza e se denuncia caricaturalmente a grosseria «burguesa», na qual há músicos e vadios irmãos da noite, Júlio criou um universo que traz o melodrama à ironia, o populismo da feira ou do circo a uma qualidade diferente de graça musical, leve e éterea, mozarteana até.

Frenando Pernes
in«Tanto de Quase Nada... »
Catálogo da Exposição Retrospectivade Júlio.
Fundação Calouste  Gulbenkian, 1979





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terça-feira, 5 de novembro de 2019

"o silêncio da pedra"



Por detrás da sombra
da pedra
por baixo da sombra
da pedra
por baixo por detrás
do silêncio
da pedra
o silêncio da pedra

António Ramos Rosa
Pintura de João Hogan, 1973, sem título

As tentações segundo as tentações ...




   Em 1974, José Luís Porfírio , director do Museu de Arte Antiga, numa abertura ímpar e com o cheiro a cravos de Abril , expôs numa sala as Tentações de Santo Antão, de Hieronymus Bosch e convidou vários artistas com intervenções programadas e interpretações do dito tríptico . Eu, por afinidade familiar com um artista convidado participei nesse inesquecível evento e aí conheci o maravilhoso e tímido João Hogan .
   Hã coisas inesquecíveis mas que passam de memória...
   Procurando um trabalho de Hogan, apareceu-me o seu tríptico, "The Temptations " de Santo Antão.
   Uma beleza.

sábado, 2 de novembro de 2019

O centenário de Jorge de Sena

GLOSA À CHEGADA DO OUTONO


O corpo não espera.Não.Por nós
ou pelo amor.Este pousar de mãos,
tão reticente e que interroga a sós
a tépida secura acetinada,
a que palpita por adivinhada
em solitários movimentos vãos;
este pousar em que não estamos nós,
mas uma sede,uma memória,tudo
o que sabemos de tocar desnudo
o corpo que não espera;este pousar
que não conhece,nada vê,nem nada
ousa temer no seu temor agudo...
Tem tanta pressa o corpo!E já passou,
quando um de nós ou quando o amor chegou.

de Fidelidade(1958)

terça-feira, 29 de outubro de 2019

"um Seat Málaga antigo"



 Manuel Vilas, que escreveu este “Em Tudo Havia Beleza” de onde vem a citação, tem histórias melhores que a minha mas sem segundas oportunidades - publicou um diário violento e não ficcionado sobre o desamparo irreparável que é a morte de uma das fontes de tudo, um pai, o meu pai, o seu pai, do pai que se ama incondicionalmente mas que condiciona a nossa maneira de amar, e de um filho, você, eu, que descobre no próprio carácter o carácter do pai:

“Um dia o meu pai deixou de se preocupar com o seu carro, um Seat Málaga antigo. Sempre se angustiara obsessivamente com o seu carro, com cuidar dele, com tê-lo sempre em perfeito estado. Abandonou-o numa garagem e deixou de conduzir. Fui eu próprio ver o carro, e estava cheio de pó. Disse-lhe: ‘Papá, o carro está cheio de pó’.
Olhou para mim, e parecia que isto sim lhe causava mossa.
‘Era um bom carro, faz o que quiseres com ele’, disse-me.
Ao desligar-se do seu carro, percebi que o meu pai ia morrer em breve; percebi que aquilo era o fim.
Foi um dos momentos mais tristes da minha vida, o meu pai estava a dizer-me adeus por interposta máquina.
Em vez de me dizer ‘temos de falar, isto está para acabar’, disse-me ‘era um bom carro’. Meu Deus, que maravilha. Viesse de onde viesse o espírito do meu pai, estava tocado pelo dom da elegância, pelo dom do inesperado, pela ingénua originalidade.
Pelo estilo.
Sentei-me numa cadeira da cozinha e fiquei a olhar para ele. Fiquei muito nervoso. Muito angustiado. Só eu em todo o universo sabia o que significavam aquelas palavras, ‘faz o que quiseres com ele’.
Estava a dizer-me algo devastador: ‘Faz o que quiseres comigo, não percebo o teu amor’.
Não percebo o teu amor.
Não te amei o suficiente, nem tu a mim.
Fomos malditamente iguais”.

Mas ser maldito é uma honra, não sê-lo também:

“O meu pai morreu com setenta e cinco anos, viverei eu mais anos do que o meu pai? Estou convencido de que viverei menos, ou talvez precisamente os mesmos anos: setenta e cinco. Mas acho que não, que partirei antes. Parece-me uma descortesia vivermos mais anos do que o nosso pai viveu. Uma deslealdade. Uma blasfémia. Um erro cósmico. Se vivermos mais anos do que os que viveu o nosso pai, deixamos de ser filhos, é a isso que me refiro. E, se deixarmos de ser filhos, somos nada”.

Pai e mãe: se os seus ainda estão vivos, e que vivam para sempre, torne-se repórter da sua família e pratique jornalismo da intimidade - pergunte-lhes o que não sabe da vida deles, faça-o hoje, daqui a pouco, agora, já, pode ser jornalismo de investigação, “mãe, o que é que lamentas nunca ter feito?”; pergunte-lhes o que não sabe das descobertas deles, pode ser jornalismo musical, “pai, when love is gone, where does it go?”. A informação aqui não é poder, é afeto. Pai e mãe: se perdeu um ou os dois, torne-se romancista, imagine grandes acontecimentos, paixões, amores, desgostos, erros, conquistas, fábulas, tragédias, contrições e contradições na existência deles. A imaginação aqui não é mais importante que o conhecimento, é saudade. Somos tantas vezes tão pouco curiosos sobre eles e que erro isso é e arrependimento será, eu sou um arrependido e o Manuel Vilas igual: “A morte dos nossos pais é abjeta, é uma declaração de guerra que a realidade nos faz. (...) Enfim, seja como for, a única coisa óbvia é que, se tiveres de perguntar algo a alguém, fá-lo logo. Não esperes por amanhã, porque o amanhã é dos mortos”. E não costumam ressuscitar como o meu Bruno.

Cronica de hoje , no Expresso Curto, de Germano de Almeida, a propósito da morte de um amigo de infância, o Bruno, que o deixou aos 10 anos. 
Da leitura que anda a fazer, Germano,  deixou esta bela e triste prosa. 
Vida e morte. 


sexta-feira, 25 de outubro de 2019

No ventre de uma mãe ...



No ventre de uma mãe havia dois bébés. Um perguntou ao outro:
 - Você acredita na vida após o parto? O outro respondeu: 
-Claro que sim. Deve haver algo depois do nascimento. Talvez estejamos aqui para nos preparar para o que virá depois. 
"Que estupidez", diz o primeiro. "Não há vida após o parto. Que tipo de vida seria essa? O segundo diz:
 -Não sei, mas haverá mais luz do que aqui. Talvez possamos andar com nossas próprias pernas e comer com nossas bocas. Talvez tenhamos outros sentidos, que não podemos entender agora.
 O primeiro respondeu: Isso é um absurdo. Andar é impossível. E comer com a sua boca? Ridículo! O cordão umbilical nutre-nos e dá-nos tudo o que precisamos. O cordão umbilical é muito curto. A vida após o parto é impossível.
 O segundo insistiu: -Bem, acho que há algo e talvez seja diferente do que está aqui. Talvez não precisemos mais deste tubo físico.
 O primeiro respondeu: - Além disso, para ter realmente vida após o parto, então por é que ninguém nunca voltou de lá? O parto é o fim da vida e no pós-parto não há nada além do escuro, do silêncio e do esquecimento. Ele não nos levará a nenhum lugar.
 - Bem, eu não sei - disse o segundo - mas certamente vamos nos encontrar com a mãe e ela cuidará de nós.
 O primeiro respondeu: -A mãe? Você realmente acredita na mãe? Isso é ridículo. Se a mãe existe, então onde está ela agora? 
O segundo diz: -Ela está ao nosso redor. Estamos cercados por ela. Somos dela. É nela que vivemos. Sem ela, este mundo não seria nada e não poderia existir.
 O primeiro diz: -Bem, eu não posso vê-la, então, como é lógico, ela não existe.
 O segundo responde: - Às vezes, quando você está em silêncio, se se concentrar e realmente ouvir, você será capaz de perceber a sua presença e ouvir a sua voz amorosa lá em cima.
 Foi assim que um escritor húngaro explicou a existência de Deus..



Carmina Burana - La Fura dels Baus

quinta-feira, 24 de outubro de 2019

Coisas do sono... Está aí a mudança da hora, mas ainda para não ficar

Prémio Nobel da Literatura André Gide escreve sobre o sono numa das suas obras mais conhecidas, “Os Frutos da Terra”.
“Adquiri o hábito de dormir frente à minha janela  escancarada, como se estivesse ao relento. Nas noites demasiado quentes de Julho, dormi completamente nu ao luar; o canto dos melros despertava-me logo de manhãzinha; mergulhava na água fria e orgulhava-me por começar tão cedo a minha jornada. No Jura, a minha janela dava para um pequeno vale que em breve se encheu de neve; do meu leito, via a orla de um bosque; nele voavam corvos ou gralhas; de manhãzinha era acordado pelos pequenos sinos das manadas; perto de minha casa ficava a fonte onde os vaqueiros as levavam a beber. Lembro-me de tudo isso. Nos albergues da Bretanha, gostava de contacto com os lençóis rugosos com a roupa da barrela que cheirava tão bem. Em Belle-Isle, despertava com os cantos dos marinheiros; corria para a janela e via os barcos afastarem-se; depois descia até ao mar.
In Os Frutos da Terra, André Gide, Lisboa, 2007, Ambar   

domingo, 20 de outubro de 2019

Um cheirinho a Oliver Sacks ....

Mulher Sentada, Picasso
Depois de você ter esgotado o que há nos negócios, na política, no convívio, no amor e assim por diante – descobrimos que nenhum deles finalmente nos satisfaz tanto e nos usa permanentemente – o que resta? A natureza. Ela permanece para trazer para fora de seus recessos entorpecidos, as afinidades de um homem ou mulher com o ar livre, as árvores, os campos, as mudanças das estações – o sol de dia e as estrelas do céu à noite ”.

Oliver Sacks

Every Thing in your Palace, Oliver Sacks

sábado, 19 de outubro de 2019

“Não há tempo para o que não é essencial.”

O ensaio a seguir, traduzido de The New York Times, é um excerto do livro “Everything in Its Place”, uma coleção póstuma de escritos do falecido neurologista e escritor Oliver Sacks.
Como escritor, considero os jardins essenciais para o processo criativo; Como médico, levo meus pacientes a jardins sempre que possível. Todos nós tivemos a experiência de vagar por um exuberante jardim ou por um deserto atemporal, andando junto a um rio ou oceano, ou escalando uma montanha e nos sentindo simultaneamente calmos e revigorados, engajados na mente, refrescados em corpo e espírito. A importância desses estados fisiológicos na saúde individual e comunitária é fundamental e abrangente. Em 40 anos de prática médica, descobri que apenas dois tipos de “terapia” não farmacêuticas são de vital importância para pacientes com doenças neurológicas crónicas: a música e os jardins.

quarta-feira, 16 de outubro de 2019

"Mulherzinhas" do séc. XIX e Mulheres do séc. XX


Mulherzinhas representa “uma nova forma de olhar as mulheres e as possibilidades que se abrem para as elas na segunda metade do século XIX” nos EUA, diz ao Observador a escritora Ana Luísa Amaral.

(via Observador)

Séc. XXI, António Costa, põe em prática no seu novo governo, pela quantidade e qualidade o número de mulheres desejado e prometido.

Um dia , ainda se irá mais longe no mundo em que vivemos. Se as mulheres vingam nas universidades, no mundo do trabalhado e da liderança ,da investigação, o mundo será delas,  desde que não se queiram parecer com os homens. 

O mundo será mais equilibrado e sensível.  Por hoje, o meu  mundo é Portigal.

terça-feira, 15 de outubro de 2019

Crónicas sem género, apesar de escritas para mulheres tristes ...

   A única noite, disse alguém, é a da insónia, a noite passada em branco. Não se guarda memória das noites dormidas. Assim é o amor: o mais inolvidável é o que nunca foi.
   Como para a insónia, também para o esquecimento existem xaropes e mezinhas . Mas são ambos remédios sem discernimento. Uns far-te-ão dormir tanto (sem sonhos e sem sono), que será como morrer. Com os outros não esquecerás tudo, quer tenha sido excelente ou desagradável.
   Não te revelo, pois, as minhas beberagens para o sono e para o esquecimento. Possuem o mesmo efeito da cicuta.

Autor, Héctor Abad Facioooolince
Planta da cicuta

quarta-feira, 9 de outubro de 2019

Costumes saudáveis....

 

   É saudável costume deitares a língua de fora à tua imagem no espelho. Por um lado, é preciso rirmos diariamente um bocado de nós mesmos; e, além disso, aproveitas para dar uma vista de olhos à cor e consistência da língua. A língua é grande depositária de segredos, como órgão interno que temos cá fora. Como hás-de ler os sinais da língua? Ah, é um alfabeto obscuro, embora cada língua tenha o seu.  Conheceres-te a ti mesma não é mais não é mais que conheceres a tua língua: olha para ela, indaga nos seus montículos e seios, pensa no que farás neste dia de hoje com ela. Não sejas linguareira. Antes do mexerico, da mentira, da traição, morde-a três vezes :depois, se quiseres, podes soltá-la.


Do livro, Receitas de Amor para Mulheres Tristes, de Héctor Abad Faciolince

sábado, 5 de outubro de 2019

5 de Outubro de 1910 e a sua 1ª bandeira



Esta foi a bandeira içada no dia 5 de Outubro de 1910 na Câmara Municipal de Lisboa. E foi bordada pelas médicas Adelaide Cabete e Carolina Beatriz Ângelo IMAGENS DO LIVRO “HERÓIS DO MAR - HISTÓRIA DOS SÍMBOLOS NACIONAIS”