2. Os sucessos da União
Europeia [15-18]
55 anos após a assinatura dos Tratados de
Roma, com os quais foi instituída a Comunidade Económica Europeia, a sua
sucessora tenta, desesperadamente, provar a si própria e ao mundo que é capaz
de passar no teste mais difícil da sua história. Ainda que, neste lugar, não se
deva esquecer que muitos dos problemas não são por culpa da UE, mas sim uma
consequência da crise financeira dos anos 2008 e seguintes – no decurso da qual
gestores de bancos se converteram, de um dia para o outro, em fiéis do Estado,
e os Governos abriram gigantescos guarda-chuvas de protecção –, a actual
situação faz-nos afinal tomar consciência do erro central que está ligado ao
nascimento do euro: num espaço económico de dimensão continental e com uma
população de tamanho equivalente, surgiu um mercado comum [16] com moeda, em
parte, comum. Mas ficou por dar o passo decisivo no sentido de uma verdadeira
união económico-política – razão pela qual não foi possível coordenar,
eficazmente, as economias dos Estados da Zona Euro. A concepção de um
«nacionalismo recíproco», segundo a qual cada Estado tem o dever de controlar e
resolver, ele próprio, os seus problemas financeiros, evitando consequências
negativas para aos outros, poderá ser suficiente, em tempo de acalmia, mas em
tempo de crise terá que falhar. Ao mesmo tempo, os acontecimentos do Verão de
2012 revelam, com toda a clareza, como todas as coisas estão relacionadas umas
com as outras: se um Estado entrar em bancarrota, arrasta outros consigo.
No meio desta agitação esquece-se, muitas
vezes, que a UE, apesar de imperfeita, pode orgulhar-se de grandiosas
conquistas: a União Europeia conseguiu o milagre de transformar inimigos
figadais em vizinhos; os seus cidadãos gozam de liberdade política e de um
nível de vida com o qual só podem sonhar outras populações de outras partes do
mundo; a adesão à UE permitiu às anteriores ditaduras da Grécia, Portugal e
Espanha converterem-se em democracias estáveis; com 27 Estados (depois da
entrada da Croácia, prevista para o 1° de Julho de 2013, serão até 28) e mais
de 500 milhões de habitantes, a UE é o maior mercado e bloco comercial do
mundo; é possível que o modelo social e económico – a domesticação do
capitalismo por parte do Estado-previdência – esteja a atravessar dificuldades,
mas dispõe ainda de importantes trunfos e reservas de impulsos para reagir à
crise financeira; seres humanos da África subsaariana ou do mundo árabe estão a
pôr-se a caminho dos confins do continente da promissão, dispondo-se a correr
enormes riscos; o desejo da Sérvia (e de outros Estados da antiga Jugoslávia)
de aderir à União prova igualmente a duradoura atractividade da Europa
organizada como lugar de liberdade e abastança. E agora tudo isto corre perigo
de ficar em ruínas.
O sucesso da União Europeia é,
paradoxalmente e ao mesmo tempo, um motivo para a sua falta de auto-estima.
Muitas das suas conquistas parecem tão evidentes às pessoas que, provavelmente,
só se aperceberiam delas se, [17] um dia, deixassem de existir. Imaginemos que
o controle do passaporte, nas fronteiras e nos aeroportos, voltaria a ser
introduzido; que não haveria, em toda a parte, regulamentos fiáveis sobre
produtos alimentares, nem liberdade de opinião e de imprensa (que a Hungria,
hoje, está a desrespeitar, razão por que este país se sujeita a ser olhado com
severidade); que não seria possível, sem ter de superar grandes obstáculos
burocráticos, os estudantes trabalharem, nas férias, em Barcelona ou Avignon;
que iria ser preciso, em viagens para Paris, Madrid ou Roma cambiar dinheiro,
outra vez, e tomar nota dos câmbios. A «Europa pátria» tornou-se a nossa
segunda natureza e precisamente isso poderia ser o motivo por que, tão
levianamente, a damos por perdida.
Seja como for, encontramo-nos,
efectivamente, num momento histórico difícil, em que deveríamos voltar a ter diante
dos olhos a pertinente definição do conceito de crise, elaborada por Antonio
Gramsci. A crise, diz Gramsci, é o momento em que a antiga ordem mundial chega
ao fim, e em que tem que ser conquistado, superando resistências e
contradições, um mundo novo. Mas é precisamente esta fase de transição que é
caracterizada por muitos erros e confusões. (10) E, hoje, é justamente a isto
que estamos a assistir: uma cisão, um interregno, a simultaneidade de um
descalabro e de um novo começo – cujo desfecho está em aberto. (11)
Perplexidade, medo, impossibilidade de saber, frustração, desassossego, mas
também o desejo ardente de mudança – tudo isto é típico de situações como
estas, em que pode ser difícil destrinçar as coisas, nas quais as expectativas
das pessoas já não se encaixam nos arranjos institucionais em que deveriam
consumar-se. Todos estes sintomas, porém, podem ser já indícios da mudança
iminente, como revelam os exemplos históricos da Reforma, da Revolução Francesa
ou da implosão do Bloco de Leste. O descontentamento é sempre também o
resultado de se estar atentando contra determinados direitos que foram sendo
historicamente adquiridos. Nós, Europeus, vivemos em sociedades que declararam
a liberdade e a igualdade como
princípios fundamentais. Como sociólogo que tem vindo a observar estes
fenómenos, não estou por isso nada surpreendido por as pessoas, na Grécia e em
Espanha, se revoltarem contra um sistema que provoca desigualdades e injustiças
de tão gritantes dimensões e que, escandalosamente, atira os custos, causados
por um sistema financeiro descontrolado, para os ombros dos grupos mais frágeis.
Uma (18) tal discrepância entre as expectativas e a realidade é sempre um motor
de mobilização social. E, de facto, nos últimos meses e anos, temos vindo a ser
testemunhas de como as pessoas, em Nova Iorque, Londres, Madrid ou Atenas, vão
para a rua – um assunto a que irei voltar, outra vez, no fim deste trabalho.
[Quarta, 31 de Outubro de
2012]
Tradução de Jaime Ferreira da Silva, professor universitário jubilado, Bochum, Alemanha
Tradução de Jaime Ferreira da Silva, professor universitário jubilado, Bochum, Alemanha
1 comentário:
«atira os custos, causados por um sistema financeiro descontrolado, para os ombros dos grupos mais frágeis.
Está montado um esquema mafioso:
- SAQUEAR OS CONTRIBUINTES PARA DAR A AGIOTAS.
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-> Os contribuintes são saqueados [e são feitos cortes no Estado Social]... para... pagar juros a agiotas!
{Blog POLITEIA: «E a primeira alternativa que temos de pôr em prática é a erradicação da OBSCENA VERBA de mais de 9 mil milhões de euros - que está inscrita no Orçamento de Estado - para pagar o serviço da dívida... tem de ser substituída por uma verba incomparavelmente menor.»}
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-> Pagar juros a agiotas [PPP´s e não só...], nacionalização de negócios 'maddofianos', etc... quais «Greves Gerais» qual carapuça... o Contribuinte tem é que reivindicar MECANISMOS PARA AUTO-DEFESA!
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Exemplo 1: Blog «fim-da-cidadania-infantil» - Direito ao veto de quem paga, vulgo contribuinte.
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Exemplo 2: PRECISA-SE de governantes que possuam a capacidade para governar... sem... saquear os contribuintes! -> eles devem assumir este compromisso... assim sendo: emissão de dívida pública... só mediante... uma autorização obtida por meio de um REFERENDO!
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Exemplo 3: A Islândia conseguiu colocar um travão nos Credores-esmifradores:
- Islândia: a revolução censurada pelos Media, mas vitoriosa!
-> Consultar o know-how islandês poderá ser muito útil para colocar um travão no esquema mafioso: «saquear os contribuintes para dar a agiotas».
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