quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Há dias para tudo... Quem tem filhos, tem cadilhos; quem os não tem, cadilhos tem...

1-10-2014 18:34
Dia Internacional do Idoso – uma reflexão com base empírica
O que é ser idoso? Oficialmente, é ter atingido os 65 anos, talvez agora passe aos 67, com as novas regras de aposentação.
Ser idoso é ser olhado com desconfiança, como um tropeço que atrasa a marcha ou um empecilho que atravanca o corredor.
O idoso, em princípio, atingiu a idade da reforma, se é trabalhador dependente. Se não a reclamar, é considerado indesejável, porque está a tirar o lugar aos novos, em tempos de trabalho escasso. Se aceitar a sua condição de idoso e se aposentar, olhá-lo-ão de soslaio, porque está a roubar o futuro às novas gerações, sonegando-lhes proventos do erário público com a despesa da sua pensão e obviando à sustentabilidade do Estado.
O idoso é um peso. O idoso é um corpo estranho numa sociedade de jovens atléticos, saudáveis, empreendedores, dinâmicos, tecnológicos até ao âmago das suas entranhas (não podemos dizer alma, porque é uma palavra idosa; também não será conveniente dizer mente, porque a mens pressupõe algo que lhes falta; e espírito parece igualmente descabido, já que é assim uma coisa etérea, volátil, indefinível).
O idoso decente e imbuído de consciência cívica, faleceria na semana subsequente à reforma da vida activa. Desta feita se evitaria até o dispêndio de tempo e recursos que representam o cálculo da reforma/pensão e o pagamento da espórtula dos acertos, sempre diferidos na data do vencimento da mesma.
O idoso é aquela cadeira em desuso que se vai procurar ao sótão ou aos arrumos, em alturas festivas, porque faz parte da decoração.
O idoso não tem nome, é designado por sexagenário, septuagenário, octogenário… (decididamente, este já devia estar fora de circulação), quando atropelado na passadeira. Os semáforos estão temporizados para gente desempenada, na força da vida.
Em meio hospitalar, o idoso é designado como sendo o da cama x, na enfermaria y. Às vezes acontece serem trocados, de tal maneira se parecem o raio dos idosos.
O idoso é aquele corpo curvado de rosto curtido e mãos nodosas que amanham o terrunho e cultivam amorosamente hortas onde crescem mimos que fazem chegar à mesa de filhos citadinos e outros a quem devem obrigações. Os idosos estão sempre em obrigação a alguém, do médico ao farmacêutico, da assistente social ao funcionário da Junta, do pároco ao motorista da carreira e por aí fora.
O idoso, quando em bando, constitui-se como um figurante aceitável em campanhas eleitorais; também será uma matéria-prima não desprezável para operadores turísticos em época baixa; também pode utilizar-se como um indicador estatístico susceptível de captação de fundos, em determinados contextos. O idoso pode revelar-se ainda como objecto de curiosidade em algumas reportagens, quando outros temas escasseiem.
Como hoje é dia dos idosos, eu, que faço parte da peste grisalha, apresento aos meus pares um manual de boas práticas.
Regra 1ª Ser discreto e parcimonioso nos actos, nas palavras e nos gestos;
Regra 2ª Nunca telefonar a horas inconvenientes (solicitar predefinição horária) nem com elevada frequência;
Regra 3ª Nunca aparecer de surpresa em casa de familiares;
Regra 4ª A visita programada deve ser curta e revelar autonomia de deslocação;
Regra 5ª Evitar em absoluto referência a dificuldades e queixas de saúde;
Regra 6ª Aparentar sempre boa disposição e um inabalável optimismo;
Regra 7ª Abster-se totalmente de ser opinativo. Ainda quando solicitada, a sua opinião virar-se-á contra si em qualquer ocasião posterior;
Regra 8ª Procurar ser útil de qualquer forma, quanto mais não seja a enxotar as moscas ao cão;
Regra 9ª Em ocasião festiva, oferecer-se para ficar na mesa das crianças;
Regra 10ª Apresentar-se sempre impecavelmente limpo e aprumado, com distinção e elegância, mas sem ostentação nem extravagância;
Regra 11ª Fazer-se desentendido ou surdo, em casos de dissidência;
Regra 12ª Nunca fazer apelo à memória.
Nota: estas regras não se aplicam a idosos de grandes posses ou que detenham poder ou pertençam a vários conselhos de administração.
@Helena Carvalho

*Há sempre dias disto e daquilo. Nada tenho contra por serem momentos de reflexão....
Partilhei este texto de um post de Helena, amiga do norte, que como eu, caminha pela longa passadeira da vida.
Escolhi esta fotografia, já aqui colocada, mas que agora posso repetir devido ao "apagão" desta alegre "casinha"..., de uma mulher que envelheceu, sem filhos, mas rodeada de amigos do coração.
Cristina Torres foi um ícone da Figueira da Foz, pela sua vida de luta num país sem liberdade, proibida de dar aulas . Era dura, de uma tempera à qual não se ficava indiferente. 
Foi a 1ª mulher a passear a bandeira da república a quando da sua implantação.
Ainda teve o privilégio e a alegria de comemorar o 25 de Abril na 1ª manifestação de rua.
Foi minha professora de Literatura. Ía receber as aulas a sua casa.
Quando da minha digressão recente pelo Porto, fui pela 1ª  vez visitar o Museu Soares dos Reis. Desejava ver ao vivo e a cores o busto da "Carvoeirinha", de que Cristina tanto me falava. Tinha uma enorme ternura ou uma enorme identificação devido ás suas origens humildes.


Sobre Cristina Torres, AQUI