sexta-feira, 12 de maio de 2017

"copo e vela dez tostões"... a treze de Maio na Cova da Iria.... (desabafos)

 Nas redes sociais brinca-se muito com Fátima . Até entrámos de novo na fase do F/f/f …. E eu apetece-me gritar f….  se,  para tantos humoristas, filósofos e jornalista, professores e escritores  e outros escribas, acrescentando aos leitores, comentadores, onde também me incluo. Mas, desta, sobre o tema,  só leio. Daí a vontade também de escrever.
Respeito as pessoas de fé, e corroborando as palavras de Frei Bento, ai de mim criticar ou pôr em causa o que leva as pessoas a fazer determinado tipo de promessas. A exploração das mesmas, é outra história.
Fui católica por tradição, e aos 15 anos saí para uma vida laica, ateia com o crescimento  e com enorme “inveja” dos homens/mulheres de fé, cujo mistério não me tocou.
Procurei sempre as explicações da vida na razão e nos humanos.  Estes últimos , também tão imperfeitos, e a caminho da” imortalidade” graças  à ciência e à tecnologia , são uma enorme fonte de decepção. E se acontecer, serão Homens?
 Mas há gente boa, muito boa, felizmente.   
Como dizia um publicista brasileiro “as únicas pessoas sem fé são que que têm saúde”.
E veio-me à memória José Afonso, o nosso Zeca, que nos fins de sua vida se agarrou a Santa Teresa d`’ Ávila e a Santo Agostinho.
A vida, desde que me lembro dela em concreto, não me deixou passar muitas coisa ao lado, no que se relaciona com Fátima.  Sou de uma cidade, Figueira da Foz, onde fins dos anos 60 /70, nesta data,  saíamos á rua depois de jantar para ver as centenas de autocarros com peregrinos, que no regresso ao norte, pernoitavam na cidade.
E o que sentíamos como um “folclore” ? A ocupação da cidade por autocarros e peregrinos, as botijas de gás que acendiam os fogões de dois bicos para cozinhar, todos os artefactos de cozinha, cobertores para dormir no chão e na relva do nossos jardins públicos,  e as senhoras que alugavam quartos para os que,  com mais possibilidade,  podiam dormir no conforto de uma cama limpa mais banho. Uma forma de subsistência, num país de fracos recursos e próprio de uma cidade que já vivia da época balnear.
Fui a última vez a Fátima tinha eu 18/9 anos. 
Já tinha ido mais vezes em excursões do liceu e a casamento. Era hábito , quem podia, casar em Fátima .
 Faz precisamente amanhã  47 anos que o  1º dia de trabalho sazonal como guia turística, na empresa AVIC, foi a Fátima. Os clientes eram ingleses, classe média, média baixa, “from” Manchester e Liverpool.  Foi precisamente a Fátima.
Quadro mais surrealista, não poderia ter acontecido na minha vida. Ainda não sabia o que era o surrealismo, ouvia falar dele, nem conhecia H. Bosch . Seria o Marrocos de que se falava nos anos 60? Talvez. Mas o comportamento e a sujidade foram aterradores.  A pobreza, a do país. A fé, a das desgraças que acontecem a cada um ou que se não desejassem que acontecesse.
A ida a Fátima, era roteiro de sábado depois de almoço.  Numa outra viagem , aonde decidi que os clientes teriam 2h para conhecer e “sentir”, foi a última que saí do autocarro.
Deparei -me com rapariguinhas jovens, grávidas, internadas em instituições religiosas de freiras/madrastas, que as faziam andar de joelhos á volta da capelinha das aparições, a penitenciarem-se do pecado …  Fiquei horrorizada.
Daí para a frente evitei ir a Fátima fazendo-me substituir por um guia espanhol, muito católico e que estimava muito a minha mãe como reputada funcionária da Biblioteca Municipal.
Sou da geração das Mães que lhes roubaram os filhos para a guerra colonial. Regressar ou não, era sempre uma dúvida . Regressar são, era outra dúvida . Daí as promessas, as caminhadas a pé a cumprir as suas promessas.  Um horror no sofrimento permitido pela igreja .
Era miúda quando o Papa Paulo VI veio a Portugal. Também aterrou  em Monte Real e passou pela Figueira.  Foi uma loucura.
Porquê criticar o ênfase dado pela  CS  desta vinda do Papa Francisco a Portugal ? Há tantos outros canais alternativos e algumas estações de rádio com boa música. ..
 Quantos “Franciscos” encontraram na vossa vida como este ? Eu, só encontrei “francisquinhos”, e,  esses meninos , e meus alunos.
Fui ver o filme/documentário Fátima de João Canijo. Gostei bastante . E ainda ontem comentei á mesa. É uma peregrinação que  quem assiste,  faz durante 2 h e tal, mas onde o país real e as idiossincrasias do ser humano estão lá quase todas .
No fim,  já em sentimento “beato”, beijam-se e abraçam-se e perdoam-se.
Fez-me lembrar outras situações de grandes encontros comunitários /partidários, onde cá fora se “apunhalam”, e lá dentro, em festa,  são todos companheiros e camaradas.  É a fé ….
É um filme   hiper realista 
Para finalizar este desabafo que tinha comigo há dias, o poeta Tolentino, numa das suas crónicas desta semana no Expresso, ao definir etimologicamente a palavra “Papa”, pai, falou da nossa enorme” orfandade de pai”. E na verdade estamos órfãos de boas referencias.  Por isso Francisco se tornou um fã de várias religiões, e de pessoas improváveis.

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( quando era miúda, ia  com a minha avó , no mês de Maio, à procissão das velas que se fazia na aldeia. Adorava aquela mística da vela acesa dentro de um copo de papel , e ouvir vendedores gritarem, “copo e vela dez tostões”… )

E… para todos os que fazem anos hoje e amanhã, “parabéns a você”… É que os há e eu conheço.

Fotografia do filme "Fátima", Rita Blanco e a outra menina que me desculpe, não fixei o nome.