segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

. O que um escritor nos dá não são livros. O que ele nos dá, por via da escrita, é um mundo. Mia Couto

«Cartas a Sandra» representa um hino ao amor numa toada filosófica que abre ao leitor perspectivas muito interessantes sobre o tema e a muitos outros que com este se relacionam - amizade, ciume, sexo, e tudo o mais que concerne às coisa do Amor.
Li este livro, em 1996, Maio. Li de uma assentada, antecedido de" Para Sempre. "A 5 de Maio desse ano morre o meu pai. A 8 a 9 ofereci o livro a minha mãe, pelo amor tão belo que sempre os vi viver. Ele tinha 71 anos, a minha mãe fará 88 na próxima quinta feira. A solidão não é palavra que se lhe encaixe, sempre bem acompanhada ou com ela própria. E, eu não parti como a Xana. 

Excerto

Julgo, aliás, que o amor, não bem o erotismo, foi por fim uma espécie de Valor que lhe redimia a vida inteira, ou, como ele dizia, qualquer coisa em que pudesse repousar a cabeça. Num tempo em que nada valia nada, surgia-lhe assim, sobretudo no fim da vida, uma forma de a justificar, como outros a redimem com a agitação política ou mesmo desportiva, que eram, segundo ele, um modo menor de a si mesmos se iludirem. 

(...) O amor é tão monótono, querida. Porque ele é o cimo sensível de uma imensidade de coisas que se esqueceram. Como falar desse mínimo que é o vértice de todo um mundo que o sustenta? Falar de nada, que é o todo nele? Sandra. Podia dizer o teu nome infinitamente na multiplicação do que nele me ressoa. E é assim o que mais me apetece, dizê-lo dizê-lo. E ouvir nele o maravilhoso que me abala todo o ser. Poderia escrever o teu nome ao longo do que escrevo e teria talvez dito tudo. Mas eu quero desse tudo dizer também o que aí se oculta. Dizer o meu enlevo e a razão de ele me existir. As tuas mãos nas minhas. O incrível miraculoso de eu dizer o teu rosto. O ardor de um meu dedo na tua pele. Na tua boca. O terrível dos meus dedos nos teus cabelos. O prazer horrível até à morte da minha entrada no teu corpo.