quarta-feira, 31 de agosto de 2016

Anna Paula, deixou o TEC , depois a vida... Aconteceu hoje

Anna Paula era linda e uma grande atriz. 
Fazia parte do Grupo do Teatro Experimental de Cascais.
Fazia parte do meu teatro e da minha vila.
Sei que os seus amigos e colegas estão hoje muito tristes.

sábado, 27 de agosto de 2016

leituras de praia ou a preparação da nossa viagem... Aconselho aos "compagnos de route"


Para uma primorosa e bem organizada viagem ao Minho a acontecer em Outubro, por uma semana, dia 11, estaremos por aqui.... (Museu Bernardino Machado – visita guiada e apresentação
Almoço
Casa de Camilo - S. Miguel de Seide -– visita guiada e apresentação).

Ora ao ler o prefácio de NOVELAS DO MINHO,  de Camilo, um dos livros saídos na coleção com que o Expresso nos tem presenteado, aconselha vivamente , a quem pensa fazer esta viagem minhota, ler estas novelas.
 Entre dois mergulhos e um sol de Agosto, o das 18h, li o 1º conto, "O Degradado". Confesso que nunca li nada de Camilo, nem o Amor de Perdição, só resumos.... 
Talvez seja a idade própria para o ler. Bem rebuscado o seu português. Deduzo as sinonimas, de contrário o dicionário teria que estar ao lado...  Vale a pena, aconselho.


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Às vezes depois do jantar, saíamos pelas aldeias a esmoer as galinhas e o presunto. A Sr, Luísa, esbelta e  farta irmã do clérigo, dava-nos em cada jantar uma galinha loura reclinada sobre um escabelo* de presunto com travesseiros de chouriço.
Havia um grande dividendo de aves na capoeira daquela casa; os divisores éramos nós; o quociente era metade das galinhas para cada um. Fiz-lhe compreender ao padre com este símile de cozinha os mistérios da aritmética.
E eu saía empanado por aquelas barrocas da Samardã, meditando e dizendo como meu Horácio:

Ibam forte Sacra, sicut meus est mos, etc

escabelo - banco pequeno que serve para apoiar os pés



sexta-feira, 19 de agosto de 2016

bom fim de semana... por hoje, refresquem-se

                                                     Melanie Biasio, pianista 

VERÃO

Lentos lentos
os dias do Verão

que passa
veloz como o vento.


ÚLTIMA LUZ DO DIA

No Verão, antes de escurecer,
os pássaros chilreiam sem parar
como se a luz quisessem prender
antes de a noite a tragar.

Poemas do Conta-Gotas
por João Pedro Mésseder

(breve regressarei aos blogues amigos)


sábado, 13 de agosto de 2016

"A sociologia da panela e do alguidar"☆


Antigamente as cozinheiras dos bons restaurantes portugueses eram umas Senhoras rechonchudas e coradas, em geral já de idade respeitável, com nomes bem portugueses ainda a cheirar a aldeia – a D. Adozinda, a D. Felismina, a D. Gertrudes – e por vezes com uma sombra de buço que parecia fazer parte dos atributos da senioridade na profissão. Tinham começado por baixo e aprendido o ofício lentamente, espreitando por cima do ombro dos mais velhos. E tinham apurado a mão ao longo dos anos, para saberem gerir cada vez com mais mestria a arte do tempero, a ciência dos tempos de cozedura, os mistérios da regulação do lume. A escolha dos ingredientes baseava-se numa sabedoria antiga, de experiência feita, que determinava o que “pertencia” a cada prato, o que “ia” com quê, os sabores que “ligavam” ou não entre si. Traziam para a mesa verdadeiras obras de arte de culinária portuguesa, com um brio que disfarçavam com a falsa modéstia dos diminutivos – “Ora aqui está o cabritinho”, “Vamos lá ver se gosta do bacalhauzinho”, “Olhe que o agriãozinho é do meu quintal”. Ficavam depois a olhar discretamente para para nós, para nos verem na cara os sinais do prazer de cada petisco, mesmo quando à partida já tinham a certeza do triunfo, porque cada novo cliente satisfeito era como uma medalha de honra adicional. E a melhor recompensa das boas Senhoras era o apetite com que nos viam: “Mais um filetezinho?” “Mais uma batatinha assada?”.

Hoje em dia, ao que parece, nestes tempos de terminologias filtradas, já não há cozinheiros, há “chefes”, e a respectiva média etária ronda a dos demais jovens empresários de sucesso com que os vemos cruzarem-se indistintamente nas páginas da “Caras” e da “Olá”. Os nomes próprios seguem um abcedário previsivel – Afonso, Bernardo, Caetano, Diogo, Estêvao, Frederico, Gonçalo, … – e os apelidos parecem um anuário do Conselho de Nobreza, com uma profusão ostensiva de arcaismos ortográficos que funcionam como outros tantos marcadores de distinção – Vasconcellos, Athaydes, Souzas, Telles, Athouguias, Sylvas… Quase nunca os vemos, claro, porque os deuses só raramente descem do Olimpo, mas somos recebidos por um exército de divindades menores cuja principal função é darem-nos a entender o enorme privilégio que é podermos aceder a semelhante espaço tão acima do nosso habitat social natural. A explicação da lista é, por isso, um longo recitativo barroco, debitado em registo enjoado, em que, mais do que dar-nos uma ideia aproximada das escolhas possíveis, se pretende esmagar-nos com a consciência da nossa pressuposta inadequação à cerimónia em curso.

A regra de ouro é, claro, o inusitado das propostas culinárias em jogo e, preferivelmente, a sua absoluta ininteligibilidade para o cidadão comum. Mandam, pois, o bom senso e o próprio instinto de auto-defesa que se delegue na casa a escolha do menu, sabendo-se, no entanto, que não vale a pena sonhar com que pelo meio nos apareça um pobre cabrito assado no forno, um humilde sável com açorda, ou uma honesta posta de bacalhau preparada segundo qulquer das “Cem Maneiras” santificadas das nossas Avós. Seja o que Deus quiser! E começam então a chegar a “profiterolle de anchova em cama de gomos de tangerina caramelizados, com espuma de champagne”,  o “ceviche de vieira com molho quente de chocolate branco e raspa de trufa”, a “ratatouille de pepino e framboesa polvilhada com canela e manjericão”, e por aí fora, em geral com largos minutos de intervalo entre cada prato e o seguinte, para nos dar tempo de meditar sobre a experiência numa espécie de retiro espiritual momentâneo…

E é de experiência que se pode aqui falar no sentido mais fugaz do termo. Deliciosa ou intragável, a oferta tende a ser, por princípio, “one time only”, porque quando o empregado anuncia, na sua meia voz enfadada, o “camarão salteado em calda de frutos silvestres e açafrão”, o uso do singular não é metafórico – é mesmo um exemplar único da espécie que se nos apresenta em toda a sua glória, ainda que possa reinar isolado no meio de um prato em que em tempos caberia um costeletão de novilho com os respectivos acompanhamentos. Se se detestar, há pelo menos a consolação de que não haverá qualquer hipótese de reincidência do crime; se se adorar – o que há que reconhecer que muitas vezes acontece – ficará apenas a memória fugidia do prazer inesperado. A função do “chefe” é proporcionar-nos no palato esta sucessão de sensações momentâneas  irrepetíveis, todas elas em doses cuidadosamente homeopáticas, um pouco como as configurações sempre novas de um caleidoscópio – ou, se se preferir uma imagem mais forte, como a versão gastronómica de uma poderosa substância alucinogénea, daquelas que faziam as delícias da geração hippie dos anos 60 quando lhe davam a ver, ora elefantes cor-de-rosa, ora hipopótamos azul-celeste. Wow!

Que saudades das Donas Adozindas, das Donas Felisminas, das Donas Gertrudes, mais camponesas ainda do que citadinas, com a sua sabedoria, as suas receitas de família, a sua simplicidade, a sua fartura, o seu gosto de servir bem, o seu sentido de tradição e de comunidade!

Texto de Rui Vieira Nery
Titulo surripiado a Antonio Ribeiro no comentario ao texto.  Tudo no FB.
Imagem Google,  "cozinheiras tradicionais  portuguesas"